A noite de terça-feira (6) passa para a história como um momento de ruptura da maioria dos deputados federais com a sociedade brasileira em nome de um corporativismo capaz de sobrepor a lei e aumentar o número de cadeiras na Câmara Federal. O argumento que prevaleceu é um absurdo questionamento do Censo Demográfico do IBGE, feito em 2022, parâmetro para que fosse feita uma redistribuição de número de deputados por estados da federação, mais o Distrito Federal.
Tão questionável quanto a proposta foi a pressa com que ocorreu a votação: a rápida aprovação do regime de urgência da matéria sobre a matéria assinada pela deputada federal Dani Cunha (União Brasil-RJ), que ganhou um substitutivo do relator Damião Feliciano (União-PB), tudo na mesma sessão. Os dois parlamentares representam estados que perderiam cadeiras em função do Censo e sobre o qual o Supremo Tribunal Federal (STF) deu prazo até o dia 30 de junho próximo para que o Congresso Nacional procedesse a redistribuição, caso contrário o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) indicaria a nova configuração.
A sessão foi tumultuada e aprovação veio de forma apertada: 270 a 207 (eram necessários 257 votos para a provação). O texto segue para o Senado.
O impacto financeiro impressiona
Em 2023, o Estado do Pará argumentou que teria direito a mais quatro deputados desde 2010, no Supremo Tribunal Federal (STF), que estabeleceu a imediata redistribuição de 14 cadeiras, tomando como base a lei de 1993.
Os sete estados que perderiam cadeiras seriam Rio de Janeiro (46 deputados) perderia quatro cadeiras; Paraíba (12), Bahia (39), Piauí (10) e Rio Grande do Sul (31) perderiam duas cadeiras cada um; e Pernambuco (25) e Alagoas (9) perderiam uma cadeira cada um.
A criação de novas cadeiras implicará impacto orçamentário de R$ 64,8 milhões ao ano, segundo informações da Diretoria-Geral da Câmara, a ser absorvido pelas previsões orçamentárias de 2027, quando começa a próxima legislatura com a nova quantidade. Outro impacto que deverá ser alocado é o de emendas parlamentares que os novos representantes passarão a ter direito de indicar no âmbito do Orçamento da União.
Santa Catarina ganhará quatro cadeiras
Antes d que foi aprovado agora pela Câmara, o Pará passará a ter mais 4 deputados (bancada de 21), da mesma forma que Santa Catarina (de 16 para 20 deputados), enquanto Amazonas aumenta sua bancada de 8 para 10, Ceará passa de 22 para 23 deputados, Goiás aumenta de 17 para 18 e Minas Gerais de 53 para 54.
No caso de Mato Grosso, cuja bancada aumentaria em um deputado, o relator Feliciano propõe o ganho de mais uma cadeira em função de cálculos de proporcionalidade que pretendem evitar o fato de um estado com maior população ter menos representantes que outro com menos população que aquele.
A exceção prevaleceu na Câmara dos Deputados, resta saber o quanto o Senado poderá modificar e ate vetar, pois os interesses são maiores na chamada Câmara Alta. Os senadores representam os interesses das unidades da federação, não da população como ocorre na Câmara Federal.
Aumento gera efeito cascata nas Assembleias
Conforme determina a Constituição Federal, o número de deputados estaduais mudará porque a Assembleia Legislativa deve ter o triplo da representação do estado na Câmara dos Deputados com uma trava de 36. Se atingido esse número, o total será os 36 mais o quanto passar de 12 na bancada federal.
Dessa forma, estados que passam de 8 deputados federais (24 estaduais) para 10 terão assembleias com 30 deputados estaduais (três vezes mais). Em Santa Catarina, haverá mais quatro cadeiras, passará de 40 para 44 vagas.
Veja como votaram os deputados catarinenses:
Apenas dois deputados federais da bancada de Santa Catarina votaram a favor do aumento de cadeiras na Câmara, entre eles a vice-líder do governo Lula na Câmara, a deputada Ana Paula Lima (PT).
Ana Paula Lima | PT | SC | sim |
Caroline De Toni | PL | SC | não |
Cobalchini | MDB | SC | não |
Coronel Armando | PL | SC | não |
Daniel Freitas | PL | SC | não |
Daniela Reinehr | PL | SC | não |
Fabio Schiochet | União Brasil | SC | sim |
Geovania De Sá | PSDB | SC | não |
Gilson Marques | Novo | SC | não |
Ismael | PSD | SC | não |
Luiz F. Vampiro | MDB | SC | não |
Pedro Uczai | PT | SC | não |
Pezenti | MDB | SC | não |
Ricardo Guidi | PL | SC | não |
Zé Trovão | PL | SC | não |
Bruno Spada/Câmara dos Deputados

Deputados aprovaram o projeto na sessão do Plenário desta terça-feira
Ajuste à população
Para os estados que contarão com mais deputados, o texto de Damião Feliciano segue as contas já apontadas pelo Supremo, com ajustes na bancada de Mato Grosso.
Assim, o Pará passará a ter mais 4 deputados (bancada de 21), da mesma forma que Santa Catarina (de 16 para 20 deputados), Amazonas aumenta sua bancada de 8 para 10, Ceará passa de 22 para 23 deputados, Goiás aumenta de 17 para 18 e Minas Gerais de 53 para 54.
No caso de Mato Grosso, cuja bancada aumentaria em um deputado, o relator propõe o ganho de mais uma cadeira em função de cálculos de proporcionalidade que pretendem evitar o fato de um estado com maior população ter menos representantes que outro com menos população que aquele.
Dessa forma, ao comparar os estados de Piauí (população de 3.269.200), Mato Grosso (população de 3.658.813) e Rio Grande do Norte (população de 3.302.406), o primeiro continuaria com 10 cadeiras tendo população menor que os outros dois, que ficariam com 9 e 8 respectivamente.
Para evitar isso, Damião Feliciano passa ambas as bancadas de Mato Grosso e Rio Grande do Norte para 10 representantes.
Igual comparação ele usou para aumentar a bancada do Paraná (população de 11.443.208) de 30 para 31, a fim de não ficar menor que a do Rio Grande do Sul (população de 10.880.506), que mantém seus 31 deputados federais.
Peso regional
Em relação à legislatura atual, a mudança nas bancadas altera ainda o peso regional proporcionalmente ao total de deputados. A bancada do Norte foi a que mais cresceu (de 65 para 71), seguida pelo Sul (de 77 para 82). A primeira corresponde hoje a 12,67% da Câmara, e a segunda equivale a 15%. A partir de 2027, o Norte será 13,37% da Casa, e o Sul terá 15,44%.
Apesar de aumentar sua bancada em três deputados (151 para 154), o Nordeste passa de 29,43% para 29% na nova composição com mais parlamentares. O mesmo acontece com o Sudeste (de 179 para 180), que diminui de 34,89% para 33,89%. Já o Centro-Oeste aumenta de 7,99% (41 deputados) para 8,28% (44 representantes). https://www.camara.leg.br/internet/agencia/infograficos-html5/tabela-2025/estados-com-aumento-de-vagas.html
Censo contestado
O texto aprovado determina que nenhuma unidade da Federação terá sua representação novamente modificada até a divulgação oficial dos resultados do censo demográfico seguinte à publicação da nova lei.
No Brasil, os censos ocorrem de dez em dez anos, e o de 2020 foi adiado para 2022 devido à pandemia de Covid-19. Se o próximo censo populacional for em 2030 ou mesmo em 2032, qualquer alteração nas bancadas deverá valer apenas para as eleições gerais de 2034, pois as mudanças têm de ocorrer em até um ano antes do pleito.
Do projeto original, Damião Feliciano manteve a possibilidade de os partidos políticos contestarem os dados do Censo perante o Tribunal de Contas da União (TCU), que deverá auditá-los. No entanto, não será permitido o uso de dados obtidos por meio de pesquisas amostrais ou estimativas entre cada censo.
O TCU terá 60 dias para julgar a impugnação, que também poderá ser proposta pela representação jurídica do estado que se considerar prejudicado.
Embora proíba o uso de outros dados, o relator prevê que, caso o TCU considere os dados não confiáveis, eles não poderão ser utilizados para fins de redistribuição de cadeiras.
Próximas revisões
Nas próximas revisões, a bancada de cada unidade da Federação deverá ser calculada conforme método de quocientes análogo ao utilizado nas eleições proporcionais (quociente eleitoral), no que couber.
Em todo caso, devem ser respeitadas as representações mínima e máxima estabelecidas na Constituição Federal (8 e 70 deputados).
Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Dani Cunha, autora do projeto
Debate em Plenário
Durante o debate do projeto em Plenário, a maioria dos deputados a favor da medida defendeu a necessidade de a Câmara decidir sobre o tema, e não o Tribunal Superior Eleitoral.
Para o líder do PP, deputado Doutor Luizinho (RJ), a eventual redução do número de deputados fluminenses mostraria que o brasileiro do Rio de Janeiro valeria menos que o de outros estados. “O que não pode é um voto no Amapá e Rondônia valer 10 vezes mais que no Rio de Janeiro, 20 vezes mais que em São Paulo”, disse.
O líder do MDB, deputado Isnaldo Bulhões Jr. (AL), afirmou ser legítima a revisão da quantidade de deputados depois de tantos anos sem a legislação ser revista. “Muitos criticam a interferência do Judiciário nas decisões do Parlamento. Esta é uma decisão interna corporis [que deve ser resolvida internamente por cada Poder]”, declarou.
O deputado Merlong Solano (PT-PI) afirmou que o Parlamento brasileiro é proporcionalmente menor que boa parte das democracias ocidentais. “O número de deputados por habitante é menor que no Canadá, no México, na Argentina, no Chile, na Alemanha, na França. Não temos um Parlamento muito grande em relação ao país de dimensões continentais”, disse.
Porém, deputados da oposição criticaram a ampliação da bancada da Câmara. O líder da oposição, deputado Zucco (PL-RS), citou outros países mais populosos que o Brasil, como Estados Unidos e Índia, e com número proporcionalmente inferior de deputados.
Para o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), vice-líder da oposição, mais injusto que reduzir o número de deputados de alguns estados é aumentar a máquina pública para atender parlamentares com receio de não serem reeleitos.
A líder da Minoria, deputada Caroline de Toni (PL-SC), afirmou que apenas aumentar o número de cadeiras, sem a redução de acordo com a diminuição da população significa descumprir o previsto na Constituição. “[O texto constitucional] não fala que tem de aumentar ou diminuir, fala que tem de ser obedecida a proporcionalidade.”
O deputado Kim Kataguiri (União-SP) criticou o discurso de que o orçamento do Legislativo suportaria um aumento no quantitativo dos parlamentares sem custo adicional. “A desculpa que não tem gasto é falsa. Tem gasto real sim para a população. É uma acomodação de interesses que aumenta a distorção que a Constituição manda a gente corrigir”, afirmou.
Segundo o deputado Chico Alencar (Psol-RJ), a proposta não resolve o problema central da proporcionalidade na representação. “Essa redistribuição buscando uma proporção mais adequada tem de ser buscada nesse quantitativo [de 513]. Está de bom tamanho”, avaliou.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
Para mais informações siga a página no Instagram
Fonte: https://scc10.com.br/colunistas/roberto-azevedo/aumento-de-deputados-aprovado-na-camara-mostra-o-distanciamento-com-a-populacao/